quinta-feira, 25 de março de 2010

Mais Renato Russo, mais Legião Urbana, pra minha alegria...


No próximo sábado, quando Renato Manfredinni Junior, o Renato Russo, completaria 50 anos de idade, será lançado o livro " Como se não houvesse amanhã" com textos inspirados em canções da Legião Urbana (saiba mais).

Abaixo segue um deles para deleite da galera. (Fonte : MPB Player)

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Pais e filhos
João Anzanello Carrascoza
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Durante quase toda a minha infância, de segunda a sexta, semana atrás de semana, havia uma hora sagrada para mim: era quando o telefone tocava, após o jantar, e eu podia ouvir a sua voz, me perguntando, Filho, como foi o seu dia? Sem saber o milagre que minha resposta podia produzir nele, eu apenas dizia, repetindo as palavras, Foi bom, e só muitos anos depois descobri que, do outro lado, meu pai as transformava, água, no vinho de seu silêncio.

Eu vivia o que me cabia, no meu tamanho de descobertas, era uma criança como as outras, saltava num instante de uma brincadeira para uma dor, e de uma dor para uma brincadeira, enchendo-me de balas e de sombras. Preso aos ensinamentos na sala de aula, ou distraído entre os amigos no recreio, eu me esquecia dele, embora no fundo esperasse com força pela hora de sua ligação. E, quando chegava, parecia-me uma hora comum, a voz dele longe, às vezes encoberta pelos chiados, às vezes tão próxima que eu a
sentia em meu ouvido como o sussurro de um anjo.


Depois que ele se foi da casa onde morávamos, eu só o tinha àquela hora, e não compreendia por que passava tanto tempo sem vê-lo. No entanto, bastava o telefone tocar, à noite, para eu sofrer aquele susto bom, e, quando a mãe me passava o telefone, nem precisava ela dizer, É o seu pai, o rosto dele já reaparecia em minha memória e uma dolorida felicidade me queimava, eu quase não dizia nada — eu só queria arder nas labaredas daquele instante.

Então cresci. Com a exatidão dos astros, meu pai continuou a telefonar no mesmo horário, todos os dias, mas já não tinha o poder de me comover. Adolescente, eu vivia desarrumado por dentro. Estava atrás de minha verdade. Procurava o que havia dele em mim, e, quando encontrava — o sorriso igual, o mesmo olhar de despedida —, eu me negava a aceitar.

As linhas da vida me desviavam do seu caminho. Eu aprendera a atirar pedras, e ele era o meu alvo preferido. A hora, antes tão sagrada, se tornara maldita. Porque eu a queria imprevista. Eu me perguntava, a cada dia, Pai, por que me abandonaste?, atribuindo-lhe os pregos que o tempo cravava em minhas mãos.

Recusei-me muitas vezes a falar com ele, surdo para a mãe que vinha bater à porta do quarto, Atende, é o seu pai. Eu me fingia de Lázaro. Vamos, atende, ele já ligou três vezes. Não, eu não queria lhe abrir o meu mar — nessa época, eu mal sabia que o pai poderia, se quisesse, vir até a mim andando sobre as
águas.

Os anos se multiplicaram, e, como um peixe, aprendi que todos estamos cercados de anzóis. A palavra do pai continuava a chegar, mas, vivendo os prodígios da liberdade, eu tinha pouca carne para o seu verbo.

Eu usufruía minhas mortes, e nada que ele dissesse me ressuscitaria de mim. Era um homem e não necessitava mais de sua providência. Mas não adiantou tentar a sorte em outras terras, a sua voz, ubíqua, sempre me encontrava: cheguei a desconfiar que não caía um fio de cabelo sem que ele ignorasse onde eu me escondia.

Há pouco o telefone tocou. A mãe me deu a notícia de que ele se foi, para sempre. Eu nem percebi que ele estava indo em cada uma daquelas ligações, quando me perguntava, Filho, como foi o seu dia? Agora, ante a ferida que se abre em mim, esta prece é apenas um band-aid.
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Saudações!!

Um comentário:

  1. eu tbm amo legião, realmente faz parte da nossa vida :). entra no meu blog tbm http://www.carinhalegre.blogspot.com/

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